Eventos sem relação

Publicado em , por macaco

Como se organiza uma existência? Nada de existencialismos, atenção. Sejamos apenas práticos.

É difícil, a menos que se viva apenas para uma coisa. Eu estou sempre a dizer que não sou missionário. Não tenho nenhuma missão. A empresa onde trabalho, ao que parece, tem; não uma, mas várias missões. Cada departamento tem uma missão.

Eu não tenho missão e portanto não tenho como me organizar. Ou talvez seja simplesmente desorganizado por natureza. Sei que, de uma maneira geral, sou.

Mas a verdade é que não consigo sequer imaginar – ou seja, já nem digo por em prática, nenhum sistema de relações entre eventos no meu dia-a-dia.

Acho que já sofro desta confusão mental há muito tempo… e se já foi pior, confesso que também já foi melhor. Senão vejamos: consegui finalmente arranjar uma oficina onde por o Mercedes a arranjar. Porém, precisei de duas tentativas para que eles se dessem efectivamente ao trabalho de verificar as três avarias de que me queixei. Agora as três avarias parecem reparadas, mas o que dizer do alarme, que estava bom e voltou avariado? E que relação tem isso com o Far Cry? Nada. Mas há uma coisa que tem a ver com o Far Cry: a nova nVidia GeForce 6800. Porque a minha boa, mas velha, GeForce 2 GTS já só dá para o básico e um jogo como o Far Cry não é para se jogar com os settings no mínimo. Isso lembra-me que estou a começar a ficar desiludido com a id, que, depois de um grande furor, nunca mais deu quaisquer novidades de jeito sobre o Doom III.

Mas como é que eu encaixo isso com o Gongfu? Não tem qualquer relação. Existe uma relação, de facto, entre as artes marciais e a empresa onde estou a trabalhar. Mas não é uma relação positiva. Antes pelo contrário, desde que, além dessa empresa, trabalho ainda na de sempre, nunca mais pus um pé num treino regular. Isso lembra-me que é Domingo à noite e que não tarda tenho que estar na cama para amanhã me levantar cedo. E lembra-me o trabalho para o cliente que estive a fazer o dia todo, em vez de me entreter com outras coisas. Mas também me deu algum gozo…

Enfim, meio confuso, vou deslizando pelo dia, sem nunca ter a sensação que estou a fazer o que devia. Estou a trabalhar, devia estar a verificar o alarme do carro? Estou a lavar o carro, devia estar a limpar a cozinha? Estou a arrumar loiça, devia estar a ver um filminho? Estou sentado em frente à tv, devia estar a treinar bases de espada? Estou a fazer uns exercícios, devia estar a desenhar um Life is simple?

E é assim que acabo por nunca apreciar ou estar verdadeiramente concentrado naquilo que estou a fazer e que nunca sinto satisfação em conseguir finalmente passar à tarefa seguinte porque, no fundo, começo imediatamente a pensar que devia estar a fazer outra coisa.

Preciso de fazer uns upgrades ao meu computador, tenho que tirar umas fotos com a nova Nikon, apetece-me ir dar umas voltas, quero dormir mais, dava-me jeito ir a um ortopedista por causa do pescoço, quero ver se arranjo energia para voltar ao treino, quero encomendar uns livros da Amazon, dava-me jeito por o Merc na revisão, queria ver se comprava alguma roupa nova, ainda não decidi se quero uns Reeboks, preciso de gravar uns CDs no escritório, era conveniente arrumar a minha secretária aqui em casa, tenho três ou quatro tiras do LIS para desenhar, gostava de mandar uma prenda de casamento ao Tritão e à Cat, mas não sei o quê, um dia destes tenho que ver se acabo de pintar o tecto da casa de banho, apetecia-me continuar a aprender a tocar o “For the love of god” do Steve Vai, era porreiro gravar mais uma dezenazinha de CDs para o iPod, tenho uma ideia para fazer um poster com piada e etc.

Etc.

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