Agarrem-se bem

Publicado em , por Pedro Couto e Santos

É isso. Agarrem-se bem, que isto vai piorar.

Há algum tempo que andava para escrever algo deste género, mas não sabia bem por onde começar… tinha a ideia do título “O Triunfo da Estupidez”, mas pareceu-me demasiado óbvio e pouco útil.

“Agarrem-se bem”, parece-me ligeiramente mais humilde e talvez sirva como algo que eu possa recordar daqui a uns anos, acompanhado de um “eu bem disse para se agarrerem bem…”

2020 há-de ser um ano recordado pela sua infâmia. Mesmo que 2021 venha a ser muito pior, ou que daqui a 10 anos estejamos debaixo de furacões de fogo, com híbridos de tubarão e crocodilo que deitam lasers pelos olhos, no centro… 2020 será sempre o ano em que calhou tanto cocó, que já não há forma de não ser visto, no mínimo, como o início de um mau bocado.

Mas nem tudo nasce aqui. As coisas têm vindo a precipitar-se para o poço da imbecilidade, em aceleração terminal, há uns anos. Podemos, talvez, culpar a Internet. Assim, de uma forma genérica e sem entrar em detalhes de se é este serviço, ou aquela plataforma. Mas a Internet não faz de ninguém estúpido — os estúpidos já andavam aí; simplesmente, agora têm formas muito mais eficazes de comunicar com outros estúpidos.

Quando estas abéculas comunicam umas com as outras, a sua idiotice cresce, exponencialmente. Começam a ganhar cada vez mais expressão e tornam-se alvos preferenciais de certa retórica política. Estas pessoas, de ideias básicas, mas inamovíveis, aproximam-se cada vez mais do poder nas suas várias expressões.

Veja-se, tão simplesmente, a pessoa que neste momento detém o poder sobre o principal arsenal nuclear no planeta: um verdadeiro lerdo. E não há propriamente forma de dar a volta a isto. O homem é um lorpa. Autoritário? Sem dúvida. Amante de ideias totalitárias? Não questiono. Mas, por exemplo, compará-lo com Hitler seria um insulto… para Hitler.

No passado, o mundo pertenceu a pessoas com vontades e, muitas vezes, punhos férreos. Alguns mais civilizados, outros, verdadeiramente maléficos, mas raramente a História nos fala de um burro. Loucos, imensos, idiotas… nem tanto.

Mas cá estamos. Grunhos por todo o lado, com cada vez mais voz, mais insanidade pública e mais adeptos. À volta desta gente, há sempre matilhas de gajos mais espertos, sempre à espera de colher os restos do caos que vão lançando. E assim vamos balançando, entre a enorme falta de pensameto crítico de uns e a perfídia de outros.

A civilização Humana está num nível razoavelmente avançado. Os últimos cento e muitos anos trouxeram-nos um salto tecno-científico que nos permite diariamente fazer coisas que, a cada década, se tornam quase magia para a geração anterior. E no entanto, este desenvolvimento co-existe com um crescimento aparente do número de pessoas que acreditam que a Terra é plana.

Claro que não há nada de errado com ser um bocadinho totó. Mas houve uma altura na nossa História em que decidimos que a razão era mais importante que tudo o resto — não que se tenha eliminado tantas outras coisas importantes para a Humanidade — mas sempre com a noção de que as coisas que nos regem, são para ser estudadas, medidas, comparadas e registadas; sem esquecer que devem ser questionadas, da mesma forma; podendo ser alteradas, caso novos estudos, medições e experiências venham a justificá-lo.

Agora, em 2020, para muitas pessoas, “li no Facebook”, é justificação suficiente, para se acreditar em coisas sem qualquer demonstração, confirmação ou prova. Aliás, mesmo na face da evidência, como o facto de durante décadas e décadas de prática, cirurgiões de todo o mundo não morrerem de horas e horas de trabalho usando máscara cirúrgica, muita gente prefere acreditar num texto cuja origem desconhece, cuja intenção desconhece, cuja informação contraria aquilo que pode ser facilmente observado.

Podem haver muitas justificações para isto, mas custa-me muito a crer que a maior de todas não seja burrice. E enquanto poderia ser aceitável acharmos que estamos a salvo dos burros, o mesmo já não poderemos dizer daqueles que esfregam as mãos de contentes com a facilidade com que os conseguem controlar para os seus próprios fins.

Por isso é que eu digo, agarrem-se bem. Cada vez mais acho que isto vai abanar e vai abanar bastante. Seja por onde for: desestabilização ainda maior do Estados Unidos que, queiramos ou não, tem um poder enorme no resto do mundo; crise climática cada vez mais grave, porque continuamos a ter pessoas que perante o tornado de lava radioactiva continuará a afirmar que nada disso existe e que “isto é normal para a época do ano”; ou extremismo político por toda a Europa — por todo o mundo — conduzido por uma data de zarolhos em terra de cegos.

Há muitos pontos de ruptura possível para a nossa civilização. E talvez tenha chegado a nossa altura. No fundo, a possibilidade da nossa extinção faz parte do modelo de Enrico Fermi. Quem sabe se não é um dos grandes filtros e não há nada a fazer?

Mas embora o potencial para nos auto-destruirmos possa fazer parte do nosso ADN, sempre me ocorreu que o mesmo viesse a concretizar-se por via da crueldade humana. Afinal, começo a desconfiar que virá pela mão de um imbecil.

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